O que fazer com a epidemia de cesáreas no Brasil?
Cesáreas desnecessárias impactam na mortalidade materna e na mortalidade infantil, sugerem estudos. Brasil é líder mundial no procedimento
Dos oito Objetivos do Milênio estabelecidos pelas Organização das Nações Unidas para o período 2000-2015, o Brasil só não cumprirá um: reduzir a mortalidade materna. Embora tenha ocorrido uma queda de 57% de 1990 a 2012, os índices nacionais são altos e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estão relacionados a dois fatores: a ilegalidade do aborto e a epidemia de cesáreas.
De acordo com o Ministério da Saúde, as principais causas das mortes maternas são: hipertensão, hemorragias, infecções, problemas circulatórios e o aborto. As quatro primeiras complicações, segundo especialistas, estariam relacionadas com o procedimento cirúrgico da cesárea. Sem perspectivas de a legislação sobre o aborto ser alterada pelo atual Congresso, resta ao governo agir sobre como os partos são realizados.
Atualmente, o Brasil é o líder mundial de cesáreas, com 57% das mulheres recorrendo a esse procedimento, muita acima da recomendação de 15% da OMS. Se esse índice tivesse permanecido em 38%, padrão identificado no ano 2000, o número de mortes maternas nos partos seria 20% menor, projeta Cesar Victora, professor da Universidade Federal de Pelotas (RS), baseado em um estudo da OMS. “A cesariana é um procedimento importantíssimo, mas que foi banalizado no Brasil, e seu uso desnecessário traz riscos à saúde da mulher, como hemorragias e infecções”, afirma.
Há um consenso entre entidades médicas e do governo sobre o alto índice de cesáreas. Por outro lado, sobram discordâncias em relação ao enfrentamento da questão.
A mais recente investida do governo foi a Resolução Normativa 368, publicada em julho, que visa coibir cesáreas desnecessárias. Pelas novas regras, os planos de saúde devem divulgar, se solicitados, os porcentuais de cirurgias cesáreas e de partos normais por estabelecimento de saúde e por médico. Além disso, operadoras também terão de fornecer o cartão da gestante e exigir que os obstetras utilizem o partograma, documento no qual é registrado tudo o que acontece durante o trabalho de parto.
Entidades médicas, contudo, dizem que a medida é inócua. Para Cesar Fernandes, diretor científico da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo, as novas regras “lançam uma cortina de fumaça sobre o problema”. “A resolução opta por demonizar o médico em vez de combater o problema, que está na falta de equipes plantonistas nas maternidades”, explica.
Atualmente, 84% dos nascimentos na rede privada de saúde se dão por meio da cesárea. No Sistema Único de Saúde, a taxa de cesárea é menor, mas já atinge 40%. Entre os riscos associados à cesárea estão o risco de hemorragias, infecções e embolia (um bloqueio vascular).